quarta-feira, 13 de abril de 2011

Décimo capítulo de Doce Fruto

10 – DOCE: QUER COMPRAR?









- Olha o doce, quem quer comprar?


- Filha, é você?


- Voltei, minha mãe. – falou Tuca jogando a mochila no chão do terraço e abraçando dona Ana Cecília.


- Estás mais gordinha!


- Claro, mãe, oito meses na casa de tia Nalda, a senhora queria o quê? Me empanturrei de doces e de outras coisas gostosas.


- Filha, estava esperando você chegar, para te contar pessoalmente.


- Que foi, mãe?


- A situação está complicada! Saí da Clínica. Demitiram um montão. Os plantões estão fracos, não dá mais para se sustentar aqui na capital. - falou dona Ana Cecília com a mão na testa e uma expressão triste.


- Quer morar em Santa Paz, mãe? - perguntou Tuca.


- O que você acha, minha filha?


- É, tia Nalda tem muitas encomendas, eu voltei para te fazer companhia, mas para mim, as coisas lá estão mais rentáveis.


- Pois é, até eu encontrar um emprego por lá, ficamos com o dinheiro dos doces, e...


- Mãe, e a casa?


- Alugamos. É um dinheirinho a mais que entra.


- Para onde a senhora quiser, eu vou junto. Agora não largo minha mãezinha por nada!


- Eu te amo, minha filha.






Algumas semanas se passaram. Tuca e dona Ana Cecília já estavam estabelecidas em Santa Paz. A produção de doces aumentara consideravelmente. Dona Nalda fez algumas reformas na casa e aumentou a cozinha. Dona Ana Cecília ajudava no que podia. Já tinha conseguido dois plantões em postos de saúde.


Roberto e Carla continuavam radiantes com a pequena Aline.


O Circo Cristal já estava na terceira cidade, depois nascimento de Julinha.






- Rosa! – gritou Francy vendo a dançarina balançando Julinha no braço.


- Oi, Francy.


- Nada!






Francy foi até o trailer de Fafá e começou a conversar com a sócia.






- Sabe o que é? Culpa sua. - falou Francy com o dedo em riste para Fafá.


- O que, Francy?


- Essa Rosa agora só fica com essa menina pra lá e pra cá.


- Culpa minha? - questionou Fafá.


- É. Para parecer a boazinha, deixou Rosa ficar com essa criança aqui no circo.


- Ela está deixando de fazer o trabalho dela?


- Mas já fez melhor.


- Então fale com ela. De vez de você fazer aquelas reuniões que surtem pouco efeito: “...leia esse texto, agora grife a parte que você mais gostou, agora todo mundo dança, olha o abraço da paz...” você chama ela individualmente e diz que não está gostando de algumas atitudes dela.


- E eu fico sendo a chata, a que chama atenção. - disse Francy.


- Para mim a Rosa está fazendo um trabalho perfeito.


- Você tem uma visão muito pequena! – falou Francy com os olhos aboticados, olhando Fafá que tinha um semblante sereno nessas horas.






Fafá fazia orações para que Deus iluminasse os destemperos da sócia. Coitada, é um ser humano, precisa de ajuda. Mas como ajudá-la? Por que ser assim?


Quando viemos ao mundo, temos a obrigação, o dever de sermos pessoas boas e não um alguém que massacre. O circo era o ganha-pão de Francy, as pessoas que estavam ali, colaboravam para o bom andamento do seu ganha-pão.


Alguns profissionais eram isentos das agressões dela, aqueles que a bajulavam. Queria viver bem com Francy? Era só bajular.


Fafá não tinha isso. Era riso, simpatia, talento. Nasceu para estar num circo. Brincava com a criançada, com o público, com os funcionários, com os animais. Talento tinha de sobra. Brilho!


Francy se esforçava deveras para ter também a admiração de todos, mas preferia estar no birô da bilheteria fazendo contas, vendo os apurados.


É obvio que gostava do que tinha construído com Fafá, mas, cada cabeça é um mundo. Era teórica, preferia reuniões teóricas do que a maestria da prática.


O Circo Cristal era um exemplo em termo de espetáculo, admirado por muitos, elogiado por vários, mas alguns que trabalharam lá, ainda carregavam mágoas da Francy. Tanto que fizeram pelo circo e nunca foram reconhecidos. Mas os elogios, que nunca vinham de Francy, deram forças para esses antigos funcionários brilharem e serem bastante elogiados em outros circos. Página virada.






- Desculpa, Francy, fiz alguma coisa que lhe incomodou? – perguntou Rosa à patroa.


- Não!


- Olha, sei que você não gosta da presença da Julinha aqui. Mas a minha filha não atrapalha de forma alguma o meu trabalho no circo. Por que uma criança com pouco mais de um mês te tira do sério?


- Ora, ela não me perturba. Só quero que trabalhe com perfeição. - falava Francy com uma expressão de ódio.


- Eu tento, me dôo muito ao circo, você não vê isso?


- Do jeito que todo mundo se doa. - descontrolada.


- Certamente. Todo mundo.






Era complicado dialogar com Francy. Ela tinha algo no olhar que não mostrava afeto pelas pessoas. Fria. Pedra.


Em Santa Paz, dona Nalda fazia os doces com a colaboração da sobrinha pela manhã. Pela tarde, Tuca saía pelas ruas de bicicleta para fazer entregas e compras das inúmeras encomendas que recebiam diariamente.


Certo dia daqueles, Tuca se desequilibrou da bicicleta pela corrente ter saído do lugar e caiu no asfalto quente em pleno meio-dia. Levantou-se rapidamente e reparou um homem se aproximando.






- Algum problema, moça? - perguntou um homem aparentando seus quarenta anos, todo sujo de graxa.


- A corrente caiu, moço. - falou Tuca levantando-se do asfalto com dificuldade e pegando a caixa de doces que caíra longe.


- Não acredito! A corrente caiu junto da pessoa certa. - disse o tal homem com um sorriso simpático.


- Por quê? - perguntou Tuca sem entender o comentário.


- É nova na cidade? Não me conhece?


- Quem é você?


- Zé Bicicleta. Muito prazer! - falou o homem estendendo a mão suja de graxa para Tuca.


- Muito prazer, sou Tuca. - sem apertar a mão de Zé Bicicleta.


- A doceira?


- Já ouviu falar de mim?


- É. Estás mais famosa do que eu. Um simples homem que conserta bicicletas não tem o valor de uma doceira.


- Zé Bicicleta? Olha, você tá gozando da minha cara ou quer me cantar.


- Cantar? Gozando da sua cara? - sorriu.


- Sim. Qual dos dois? Ou você acha que eu vou acreditar que o anjo Zé Bicicleta caiu do céu para colocar essa corrente? - perguntou Tuca possessa.






Zé se ajoelhou e colocou a corrente da bicicleta de Tuca como num toque de mágica.


Tuca acompanhava com os olhos todos os movimentos dele e a cada segundo ficava envergonhada por ter sido antipática.






- Desculpa. Quanto lhe devo? - perguntou Tuca ainda sob efeitos da vergonha.


- Me deve uma visita na oficina de bicicleta. Tenho que dar uma guaribada nessa pobre.


- Tá velhinha, né? Eu vou lá sim. - sorriu.


- Quando? - perguntou Zé Bicicleta.


- Não sei, quando folgar mais. - falou Tuca.


- Sábado, você aparece lá?


- Tá bem, Zé, apareço sim.






Zé Bicicleta mostrou onde era sua humilde oficina e no sábado Tuca apareceu por lá...











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