quarta-feira, 13 de abril de 2011

Décimo terceiro capítulo de Doce Fruto

13 – DOCE ALINE, DOCE ZEZA E DOCE JULINHA.








Aline Albuquerque estudava no Colégio Base desde o Maternal, já estava na quinta série e era bastante inteligente e sagaz. Era muito entrosada com todos e fazia questão de preencher o horário oposto do seu estudo com outras atividades só para ficar no colégio os dois turnos.






- Minha, filha, saiba que o estudo é tudo nessa vida. Papai e mamãe se esforçaram muito para ter tudo isso que temos. Devemos isso ao estudo - aconselhava Roberto.


- Adoro estudar, pai - dizia a simpática Aline.


- Pois é. Papai já trabalha com o vovô há anos, mas mesmo assim continua estudando, pois quero alcançar meu sonho.


- Ser juiz, né isso, pai?


- É isso, Aline. Ser juiz!


- Pai, a mamãe vai demorar em Nova Iorque? - perguntou Aline com o olhar fixo em Roberto.


- Mais uns cinco dias. Foi fazer compras para a LpontoA com sua avó.


- Tenho saudades dela.


- Tá te faltando alguma coisa, filha? - perguntou o pai preocupado.


- Tá.


- O quê, Aline?


- Uma historinha bem linda para eu conseguir dormir.


- Sua mãe sempre lhe conta?


- Você vive mesmo no mundo da lua. Ela entra todas as noites e me conta histórias para eu dormir.


- Ela lê? - perguntou Roberto.


- Que nada, sabe tudo de cor.


- Posso te contar uma hoje?


- Você sabe alguma, papai?


- Sei uma linda!






Roberto pegou a doce Aline no braço e a levou para o quarto. Em sua cabeça, só processos e estudos para o concurso de juiz que era tão prometido e nunca acontecia no Estado.


Deitou a filha na cama e pensou em alguma história. Nada! Só leis! Pensou nas histórias que dona Lídia lhe contava quando criança. Nada! Até que...






- Era uma vez um garoto chamado Beto. Era jovem, bonito e adorava andar de ônibus. Certo dia daqueles, estava indo para a sua faculdade e encontrou uma linda menina dentro do ônibus. O nome da menina era Tuca, ela tinha uma linda cesta de doces nas mãos. Vendia esses doces na mesma faculdade que Beto estudava. Os dois se conheceram ali, conversaram bastante e acabaram namorando. Foi um namoro lindo! Beto estava bobão pela Tuca. Foram assistir a apresentação de um circo juntos. E...


- Não dormi ainda, papai. Pode continuar a história.


- Continuar?


- Sim. Estou esperando o final feliz.


- O final feliz? - sorriu Beto.


- Claro! O final feliz. Então Beto e Tuca...


- Filha, essa história não tem final feliz.


- E você começou a me contar uma história com final triste?


- Na verdade, quando me contaram essa história eu adormeci e não sei o final dela.


- Tá bom, papai, pode voltar para os seus estudos. Boa noite!






Roberto deu um beijo na filha e só ali, então, que percebeu que continuava adormecido. E o final da história?


Zeza, Zé Bicicleta e Tuca estavam na sala de televisão quando a aplicada garota lembrou-se da tarefa de casa para entregar no dia seguinte. Foi até a bolsa e leu o enunciado: Pedir para seu pai ou sua mãe contar uma história que conheceram na infância ou adolescência.






- Tuca, não tenho jeito para essas coisas. Faça você com Zeza essa tarefa, que eu vou dormir. Estou um trapo! - falou Zé Bicicleta.


- Tá certo, Zé.






Zé Bicicleta levantou-se do sofá e Tuca sentou-se à mesa com a filha.


- Escreve aí, Zeza: Era uma vez uma garota que estava dentro de um ônibus, quando surge um garoto bonito e senta-se ao seu lado. Os dois começam a conversar e pararam no mesmo ponto de ônibus, na faculdade. Ele estudava lá e ela vendia doces no mesmo lugar. Se apaixonaram, começaram a namorar em um circo. Então.


- Então o quê?


- Então ela engravidou de uma garotinha e foi contar para o Betinho, que era o nome do seu namorado. Mas ele nem quis escutar, acredita?


- Não foram felizes para sempre? – perguntou Zeza com olhos arregalados para a mãe.


- Não. Ele se tornou da noite para o dia o homem mais cruel desse universo e acabou o namoro.


- E ele não ficou sabendo da filha que ela teve?


- De jeito nenhum. Ela não contou e teve uma bela garotinha escondida de todos. Mas sabe que ela também virou uma má pessoa?


- Nossa, mamãe, que história!


- Pois é, ela deu a criancinha para a mulher que fez o parto dela numa calçada.


- E aí, mãe?


- E aí eu não sei mais. Não me contaram o que aconteceu com a mãe e com a filha.






No Circo Cristal, Julinha conversava com a mãe dentro o trailer. Julinha e Rosa tinham uma relação de amizade muito intensa, apesar das brigas constantes por motivos banais. Naquele dia, Julinha amanheceu com vontade de saber alguns detalhes sobre a sua vida.






- Mãe, já tenho dez anos de idade. Para você posso parecer uma criancinha bobinha, mas preciso saber sobre minha história. Sobre o meu pai, sobre meus tios, primos, avós...


- Julinha, estou cansada, minha filha, depois falamos disso. Tivemos três apresentações hoje. - disse Rosa querendo fugir daquele assunto.


- Mãe, você tem tantas fotos lindas de sua carreira aqui no circo. Por que não tirou uma grávida de mim?


- Ia tirar uma foto gordona? Pra quê? Deus me livre só ia ficar com vergonha.


- Não nasci de tua barriga.


- Ora, Julinha, o que é isso agora? - espantou-se Rosa olhando firmemente para a filha.


- A Francy e o Flávio já escorregaram e soltaram algumas. Mãe, eu não me importo de ter nascido de outra barriga. Você é minha mãezinha e sempre será.


- O que eles disseram? - perguntou Rosa derramando uma lágrima na face.


- Nada disso importa.


- Tá bem, Julinha. Vou contar a tua história: eu estava num dia terrível de depressão, desistindo de trabalhar definitivamente aqui no circo. Francy vivia um daqueles dias de ataque. Esculhambou-me da hora que acordou até perto da primeira apresentação do dia. Decidi não me apresentar. Fui para uma esquina próxima ao circo, curtir um pouco minha solidão. Mal acreditei quando vi uma mulher já quase tendo neném, chegando perto de mim e me pedindo ajuda. As contrações eram intensas. Ela parou, olhou para o nosso circo alguns segundos e eu fiz o parto dela em plena calçada. Era você chegando ao mundo!


- E...


- E depois do parto ela simplesmente me presenteou com você. Disse que não podia lhe criar e desapareceu como um anjo.


- Mal acredito que alguém possa fazer isso! – falou Julinha emocionada.


- Pois é, querida. Não sei absolutamente sobre ela. De onde veio, pra onde foi, qual o nome.


- Nem precisa, para quê vou atrás de uma pessoa dessas? Você é minha mãe e mais ninguém.






As duas se abraçaram demoradamente. Emoção e muitas lágrimas naquele trailer.





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